Resumo: Artigo 35970
O programa da autonomia da tecnologia do ciclo do combustível nuclear no Brasil (2, 4, 5)
Ana Andrade, Museu de Astronomia e Ciências Afins, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 202 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 34 - Chair: Nara Azevedo
Abstract.
Apesar das controvérsias sobre a utilização da energia nuclear para a geração de energia elétrica no Brasil, há consenso em torno de três aspectos que caracterizam essa história ao longo de mais de cinqüenta anos: o desejo imperioso de dominar a tecnologia do ciclo do combustível; a instabilidade da política e das instituições da área nuclear; e a dualidade das finalidades de alguns órgãos e projetos de pesquisa. A questão da energia nuclear despontou no Brasil, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, como essencial à segurança nacional, ao desenvolvimento econômico e ao bem-estar social dos cidadãos. A potencialidade do uso da energia nuclear para fins bélicos e pacíficos resultou, no plano da coexistência pacífica entre as nações, na criação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Para organizar as atividades de pesquisa, regulamentar e fiscalizar seu uso, no Brasil foi criado o CNPq (Conselho Nacional de Pesquisas), em 1951, cujas atribuições passaram para a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), em 1956. O almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva tornou-se o ícone da primeira fase desse processo, ao aglutinar setores das Forças Armadas, da indústria, da ciência e técnicos do Estado. Além da necessidade de superar enormes obstáculos para produzir e utilizar a energia nuclear (recursos, formação de pessoal, montagem da infra-estrutura de pesquisa, prospecção mineral, etc.), o CNPq comprou três ultracentrífugas para enriquecer urânio na República Federal da Alemanha, que foram apreendidas pelas tropas de ocupação dos Aliados e só chegaram ao destino anos depois. Em plena Guerra Fria, os Estados Unidos não deixaram embarcar o equipamento e, em 1975, atuaram para impedir a transferência da tecnologia de ultracentrifugação prevista no acordo nuclear Brasil-Alemanha. A vinculação entre desenvolvimento econômico e segurança nacional, e a política exterior voltada para diminuir a dependência dos Estados Unidos que caracterizou os governos da ditadura militar após 1968, impulsionaram os convênios de cooperação técnico-científica firmados com a França e Alemanha. No final da década de 1970, militares envolvidos em pesquisas na área nuclear asseveraram que o acordo com a Alemanha não garantiria a transferência da tecnologia do enriquecimento de urânio, portanto, o domínio de uma etapa vital do ciclo do combustível. Concluíram que também os acordos tripartites de salvaguardas firmados entre Brasil/RFA/AIEA limitavam a autonomia brasileira. Em aliança com o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) e o apoio político de mais alto nível desde 1979, o programa secreto da Marinha tinha por objetivos o desenvolvimento da tecnologia nuclear para propulsão de submarinos e, evidentemente, a fabricação do combustível. A cargo do Centro Tecnológico da Marinha de São Paulo (CTMSP), o programa começou com a construção do Centro Experimental Aramar (Iperó, SP) tendo o almirante Othon Pinheiro como porta-voz da "rede das ultracentrífugas", cuja reconstrução é o objeto desta pesquisa. No final de 1981, foi concluída a primeira ultracentrífuga; oito meses depois, realizado o primeiro experimento de enriquecimento; em 1984, entrou em operação a primeira minicascata de centrífugas; e em 1987, o programa foi incorporado às pesquisas oficiais. O CTMSP transferiu as centrífugas para a Indústrias Nucleares do Brasil onde, em 2004, tiveram início os testes de enriquecimento de urânio a 3,5% em escala industrial. A cidade de Resende (RJ) foi palco dos conflitos entre a AIEA e o Brasil, que defendia o direito do segredo da tecnologia. Após os acordos de salvaguardas com a AIEA e ABACC, a primeira cascata foi inaugurada. Passados trinta anos, o urânio brasileiro percorre um caminho com menos barreiras políticas das jazidas até os reatores de Angra dos Reis, devido ao êxito das peripécias dos atores envolvidos na "rede das ultracentrífugas": engenheiros militares, indústria nacional, pesquisadores do IPEN, presidente da CNEN, Conselho de Segurança Nacional, Presidência da República, professores universitários...